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A incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) em heranças e doações que envolvam doadores e bens de propriedade de de cujus no exterior tem sido objeto de intensos debates no Brasil.

Em 2021, em sede do julgamento do Tema 825 de repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucionais diversas normas estaduais que previam a cobrança do imposto sem a edição de lei complementar, nos moldes exigidos pelo artigo 155, §1°, III da Constituição. Apesar da decisão, a falta da lei complementar gerou incertezas, levando o STF a conceder, em 2022, um prazo de 12 meses para o Congresso editá-la, o que ainda não ocorreu.

Com a Emenda Constitucional n° 132/2023, o Congresso introduziu um regramento provisório para o ITCMD, estabelecendo regras mínimas para transmissões com elementos internacionais, a despeito da ausência da lei complementar. O texto provisório regula a competência tributária para bens imóveis e doações com doadores no exterior, mas não encerra totalmente o debate. Assim ficou a redação:

“Art. 16. Até que lei complementar regule o disposto no art. 155, § 1º, III, da Constituição Federal, o imposto incidente nas hipóteses de que trata o referido dispositivo competirá:
I – relativamente a bens imóveis e respectivos direitos, ao Estado da situação do bem, ou ao Distrito Federal;
II – se o doador tiver domicílio ou residência no exterior:
a) ao Estado onde tiver domicílio o donatário ou ao Distrito Federal;
b) se o donatário tiver domicílio ou residir no exterior, ao Estado em que se encontrar o bem ou ao Distrito Federal;
III – relativamente aos bens do de cujus, ainda que situados no exterior, ao Estado onde era domiciliado, ou, se domiciliado ou residente no exterior, onde tiver domicílio o sucessor ou legatário, ou ao Distrito Federal.”

Possível interpretação dos estados

Embora o julgamento do STF e a reforma tributária tenham aparentemente pacificado a questão, persiste a possibilidade de novas disputas. Isso porque alguns estados podem adotar uma leitura estrita do artigo 155, §1º, I de forma a privilegiar a localização do bem imóvel para definir a competência tributária, independentemente do domicílio do doador.

Nessa interpretação, a competência para cobrar o ITCMD sobre bens imóveis é atribuída exclusivamente ao Estado onde o bem está situado, sem a necessidade de uma lei complementar para regulamentar a matéria.

Essa linha de pensamento parte da redação do dispositivo constitucional, que estabelece que a competência para a cobrança do imposto sobre bens imóveis e seus respectivos direitos pertence ao estado em que o bem esteja localizado. Mesmo que o doador resida no exterior, os fiscos estaduais poderiam sustentar que a competência para tributar o imóvel localizado no Brasil permanece inalterada, considerando irrelevante o domicílio ou residência do doador ou do donatário.

Nesse entendimento, a competência para cobrar o ITCMD sobre imóveis seria atribuída exclusivamente ao Estado onde o bem está situado, independentemente da existência de lei complementar, uma vez que essa competência seria considerada definitiva e incontestável.

Para bens móveis, títulos e créditos, no entanto, o §1º, II do artigo 155 da CR/88 define que a competência tributária depende do domicílio do doador ou de onde era domiciliado o de cujus, o que não se aplicaria a bens imóveis. Esse tratamento diferenciado reforçaria a possibilidade de os fiscos estaduais adotarem uma postura mais restritiva em relação a imóveis.

Não parece absurdo que os fiscos estaduais possam fazer essa interpretação. De fato, mesmo que venha a ser editada a lei complementar, a competência para a instituição do ITCMD relativamente a bens imóveis e seus respectivos direitos permaneceria com o Estado da situação do bem, já que a Constituição define a territorialidade como critério para a fixação de competência nesses casos.

A resolução da Secretaria da Fazenda mineira

Um indício dessa postura é a recente publicação da Resolução SEF N° 5.833 pelo estado de Minas Gerais, que cancela a cobrança do ITCMD em doações de bens móveis quando o doador reside no exterior e o donatário está domiciliado no estado. No entanto, a resolução não aborda a doação de bens imóveis nessa mesma situação. Essa omissão pode indicar que o fisco estadual esteja mantendo uma interpretação de competência sobre imóveis localizados no Brasil semelhante a que foi apontada acima. Que outra justificativa poderia haver para a exclusão dessa hipótese da resolução?

De toda forma, o STF deixou claro que, nas situações que envolvem elementos de conexão no exterior, a cobrança do ITCMD depende de uma lei complementar. No acórdão do RE 851108/SP, a Suprema Corte, inclusive, definiu o que constitui esse “elemento de conexão”, afirmando que se caracteriza quando “o transmitente tenha domicílio ou residência no exterior, os bens inventariados estejam localizados fora do Brasil, ou o próprio inventário seja realizado no exterior.”

Ainda que os estados possam privilegiar a localização do bem imóvel como critério absoluto de competência, tal interpretação sem o respaldo de uma lei complementar é inconstitucional e passível de contestação judicial. O STF já determinou que a cobrança do ITCMD, em situações que envolvem conexão internacional, deve considerar esses elementos de conexão. Portanto, é imperativo que os fiscos respeitem os limites estabelecidos pela jurisprudência, sob pena de gerar ainda mais insegurança jurídica.

Fonte: Conjur

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